5.ª edição da BoCA tem início hoje em Lisboa e Madrid

A programação da BoCA -- Bienal de Artes Contemporâneas decorre sob o tema 'Camino Irreal', ainda com curadoria do programador cultural John Romão - que em abril foi escolhido para diretor artístico de Évora Capital Europeia da Cultura (CEC) 2027 -, e este ano tem por objetivo reforçar relações artísticas entre as duas capitais ibéricas, envolvendo no projeto 30 instituições culturais de ambos os países.
A 'escultura-forno' 'Alcindo Monteiro', de Gabriel Chaile, presta a partir de hoje, em Madrid, homenagem ao jovem português de origem cabo-verdiana assassinado em 1995, em Lisboa, num crime de ódio racial que se mantém como referência da luta contra o racismo em Portugal.
Criada em barro e com traços antropomórficos, a peça faz parte da investigação de Chaile sobre memória coletiva e rituais comunitários, articulando saberes ancestrais e práticas artesanais com o presente, tendo sido apresentada pela primeira vez em Lisboa na edição anterior da bienal, em 2023.
A instalação será apresentada em Madrid ao longo de três tardes, com a parceria de La Casa Encendida, no espaço Esto es Una Plaza, no bairro de Lavapiés, e será acompanhada por um programa público com ações musicais e performativas, ampliando o diálogo entre práticas artísticas, território e comunidades locais.
Até 26 de outubro, a BoCA pretende estabelecer um novo eixo ibérico de criação e apresentação artística, reunindo projetos transdisciplinares que cruzam as artes performativas e visuais, a música e o cinema.
Um dos destaques desta edição é a "estreia absoluta" da ópera 'Adilson', encenada por Dino D'Santiago, com libreto de Rui Catalão, sobre a luta de milhares de pessoas pela cidadania e o direito a serem reconhecidas no país onde vivem.
'Coral dos Corpos sem Norte', espetáculo do artista angolano Kiluanji Kia Henda, numa parceria com o Teatro Nacional D. Maria II (TNDM), estreia-se no próximo dia 20, na Sala Estúdio Valentim de Barros, nos Jardins da Bombarda, em Lisboa, onde regressará no dia seguinte.
A obra reflete sobre as migrações como "processo da pemba", ritual para um caminho "sem início e sem final".
Nesse movimento de migrantes para Norte, lê-se na apresentação da obra, "ao invés de paraísos", o que se encontra é "uma realidade atroz", com o Mediterrâneo transformado em "cemitério de corpos sem norte". Uma reflexão sobre a Europa, o colonialismo e pós-independências em África.
Entre os destaques da programação estão também uma nova instalação da artista plástica Adriana Progranó, que ocupa o espaço público, a performance 'De espiral em espiral', "que cruza história colonial e práticas de adivinhação familiar", do artista multimédia guatemalteco Naufus Ramírez-Figueroa, e a vigília performativa 'O Julgamento de Pelicot', do encenador suíço Milo Rau, com a atriz Servane Dècle, apresentada em julho no Festival d'Avignon, "construída a partir do caso real de violência sexual que chocou França e o mundo, onde a justiça é interrogada no espaço da arte".
Os realizadores João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata vão apresentar o novo filme '13 Alfinetes', "que articula devoção e desejo em diálogo com a memória visual de Lisboa e Madrid", e a coreógrafa Tânia Carvalho e a cantora e performer Rocío Guzmán irão apresentar um concerto que conjuga "cancioneiro tradicional português e flamenco para refletir sobre heranças partilhadas".
Outros destaques da programação passam pelo projeto 'Uma ficção na dobra do mapa', dos coreógrafos e bailarinos Elena Córdoba e Francisco Camacho, que revisita o primeiro encontro entre ambos, e a criação 'Os rapazes da praia de Adoro', que "parte do imaginário queer e da intimidade masculina, para pensar a relação entre Portugal e Espanha", pelo dramaturgo e encenador espanhol Alberto Cortés e o pintor português João Gabriel.
A 5.ª edição da BoCA irá acontecer em equipamentos de Lisboa e Madrid, como o Centro Cultural de Belém, a Fundação Calouste Gulbenkian, o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia, a Culturgest, o Teatro do Bairro Alto, a Estufa Fria, as Carpintarias de São Lázaro e a Cinemateca Portuguesa, o Museu do Prado, o Museu Rainha Sofia, o Theatro de La Abadia, o Museu Nacional do Traje e a Filmoteca Espanhola.
Em declarações à agência Lusa, o curador John Romão disse existir neste trabalho uma intenção muito forte de "reforçar e ampliar" as relações entre artistas e instituições culturais ibéricas.
"Estamos realmente a reestruturar, a reforçar e a ampliar essas relações ibéricas [...] que têm sido pouco trabalhadas desta forma tão representativa. Estamos a reconhecer a situação de incerteza num mundo em constante ruído [...]. É importante reimaginar um futuro mais equilibrado. A criação artística é sempre um caminho irreal, de refúgio e resistência", disse John Romão.
O curador da BoCA garantiu que a participação de 20 entidades culturais portuguesas e dez espanholas "é o maior número implicado num projeto cultural entre Portugal e Espanha até agora".
Nesta edição, estão ainda programadas a exposição 'Dialeto', de Felipe Romero Beltrán, no Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado e nas Carpintarias de São Lázaro, e o concerto-performance 'The Spirit Lamp', de Chrystabell, n'A Voz do Operário, com música de David Lynch.
Em '¿De qué casa eres?', a artista visual Ana Pérez-Quiroga criou o seu primeiro filme, a exibir no Cinema Fernando Lopes, e, com ele, uma performance relacionada com a imagem em movimento.
O ciclo 'Quero ver as minhas montanhas', por seu lado, revisita o legado de Joseph Beuys a partir das suas próprias montanhas reais e simbólicas.
Leia Também: Bolsa criada para "reforçar presença feminina nas artes" conta com dez finalistas
noticias ao minuto